sábado, 24 de julho de 2010

O Dia Seguinte

Ele abriu seus olhos, tateou o despertador que berrava ao lado da cama e num toque sonolento transformou a campainha irritante numa bela canção para despertá-lo – pensou que deveria programar o rádio para já acordá-lo com belas canções, mas novamente ele iria adiar essa função: Amanhã eu coloco isso direito...

Fitou o teto por alguns minutos num misto de ansiedade e medo, não sabia se os eventos da noite anterior teriam ocorrido antes ou durante o sono; a forma como todos os toques e palavras e sorrisos se encaixavam perfeitamente com suas aspirações e necessidades justificavam o receio de que aquilo tudo não tivesse passado de um delírio onírico.

Após algum tempo sorrindo como nos seus dezesseis anos, juntou coragem o bastante para levantar-se da cama e procurar em sua carteira aquilo que determinaria se a experiência a qual o fascinava havia sido vivenciada ou imaginada, após folhear alguns documentos inúteis encontrou o guardanapo com o nome e o telefone d’Ela. Abriu um largo sorriso e consultou o relógio: Cedo demais para ligar.

Tentou exercer frieza e indiferença, sabia que a ansiedade e a precipitação poderiam colocar tudo a perder – especialmente depois de um certo trecho da conversa que tivera com Ela na noite anterior (quando começaram a vasculhar suas almas em buscas de infinitas afinidades comuns). Buscou canalizar sua atenção para todas as inúmeras distrações que costumavam fazer o dia correr mais rápido, porém foi em vão. A cada minuto que não passava o frio na barriga parecia aumentar, ficava revivendo cenas daquela noite que, embora parecesse eterna, infelizmente não foi.

Imaginou como Ela estaria naquele momento, mas logo afastou esses pensamentos da cabeça por medo de toda aquela euforia não ser recíproca. Mas depois daquela noite, teria como não ser? Uma vez mais ocupou sua mente. Os entretenimentos cotidianos não adiantavam, lamentou ter sido acordado tão cedo – parecia que seu despertador estava se vingando de todas as vezes em que fora ignorado.

Repassou novamente a canção que tocava na primeira vez que seus lábios se tocaram e depois mais zil outras que seriam capazes de substituir, dignamente, a trilha sonora de Perfume de Mulher – aliás, lembrava-se também do aroma doce que a pele d’Ela exalava. Se não estivesse em terra firme, juraria que estivera com uma sereia e possivelmente nadaria de bom grado em direção ao trono de Netuno. Fazia tempo que seus dias não tinham um fundo musical tão belo.

Não conseguiu se conter por mais nenhum segundo, ligou. Três toques (que para Ele pareceram 3.000.000.000.000.000) foram o suficiente para aquela voz suave atender também apresentando um leve tom de ansiedade e euforia, bastou um acorde daquela doce melodia para que todas as preocupações sumissem – em pouco tempo estavam rindo-se ao telefone e marcando, ansiosamente, o próximo encontro.

Todas as outras mulheres do mundo, mesmo as que lhe assediavam, pareciam nada naquele momento: Seus pensamentos voltavam-se apenas para a tarefa hercúlea de fazer com que o segundo encontro fosse tão ideal quanto o primeiro.

Sentou-se defronte à sua prancheta mental e começou a traçar os planos para o dia vindouro, teria todo o tempo do mundo para isso já que o dia de hoje arrastaria-se por uma eternidade. De repente, um estalo. Fora o Destino e a Naturalidade que orquestraram o primeiro instante de romance, portanto não mais faria planos. Optou por escrever sobre as sensações que o dia maravilhoso que vivenciara havia deixado em si.